A leitura desse livro, com que Márcia Sá Cavalcante Schuback quis oferecer uma aventura de pensamento e criação ao centenário da UFRJ, teve sobre mim o efeito de uma velocíssima visita a um passado bom. A um tempo melhor, habitado pelo entusiasmo e a esperança. Não é pouca coisa para acarinhar esse nosso tempo de encarceramento e morte. É talvez banal dizer que me propiciou uma viagem no tempo. Mas quando, nessa nossa tortuosa atualidade, as utopias fugiram do horizonte – os horizontes fugiram – e os futuros se insinuam catastróficos e distópicos, às vezes o passado é o tempo da esperança. Foi para lá que viajei. Trabalhamos juntos, Márcia e eu, na gestão do reitor Horácio Macedo (1985-1990). Saíamos da ditadura, ele foi o primeiro reitor eleito pela comunidade acadêmica no Brasil, um renascimento da universidade crítica, cheia de energia vital. Ele me convidou para dirigir o Fórum de Ciência e Cultura, e para essa aventura do pensamento que age foi que trouxe Márcia do seu doutorado no IFCS. E ela fez acontecer. Fizemos juntos. Ombro a ombro, se diz. Pois foi assim: ombro a ombro. O Fórum era um vazio. Vazio institucional, de ideias, de beleza. O que Márcia fez foi povoá-lo, na área da cultura, com inteligência, sons, imagens, corpos em movimento. Excelentes ciclos de conferências, música, teatro, exposições. Arte que pensa, pensamento que se dá a ver no brilho da beleza, que é um dos modos de desencobrimento da Verdade. E o registro dessa ressurreição – na verdade, desse primeiro nascimento – foi pensado na revista Arte e Palavra, que criou e dirigiu. Foram apenas quatro números. Faltava-nos tudo até para esses quatro. Foram feitos. Mais não deu. Mas são até hoje o arquivo múltiplo de uma bela experiência do pensamento que faz, da criação que pensa. A essa experiência é dedicado esse livro. Descreve uma história, fundamenta um projeto, alegra-se com as pessoas que estiveram ao seu lado, que aí continuam, amizades dessas que, como se diz, “fazem-se no trabalho”. É muito mais do que isso, é muito melhor. São pessoas que se criaram juntas, à medida em que iam criando um mundo, que não existia. Criação, poiese, poesia em ato. Isso não é um trabalho apenas, é uma vida. Pode ser um destino. Se for assim – e foi, dou testemunho -, esse projeto, trazido aqui de novo à memória, bem podia desentupir os canais do futuro e reintroduzir esperanças. Redesenhar utopias alegres.